Arquivo para 12 de janeiro de 2011

MOSUO – A SOCIEDADE LIDERADA POR MULHERES

Estamos tão acostumados com nosso ambiente de convívio – sociedade, cultura, e por ai vai – que temos dificuldade de conceber a existência de organizações sociais que fogem de nosso modelo. Somos egoístas, olhamos os outros tendo a nós mesmos como medida. Penso nisso quando lembro de pessoas que defendem a família nuclear – pai, mãe e filhotes – como algo algo natural e sem o qual a existência humana é inconcebível. Essa pessoas ignoram a pluralidade de modelos familiares que existiram ao longo da própria história ocidental, pior, ignoram modelos de outras culturas mais distantes e isoladas geograficamente. Essas pessoas utilizam-se da suposta sacralidade e naturalidade da família nuclear para afirmarem que o crescimento numérico de famílias lideradas por mulheres ou compostas por casais homossexuais é o sinal do fim dos tempos. O erro dessa gente mostra-se risível quando confrontamos estudos antropológicos e históricos que oferecem diversos exemplos de sociedades bem-sucedidas que fogem do padrão Ocidental cristão. Um desses exemplos é o povoado dos mosuo, localizado às margens do lago Lugu no sudoeste da China.

 

Mulher mosuo e seu bebê

A sociedade mosuo é matriarcal, ou seja, nela as mulheres ocupam o lugar central. São as responsáveis pelas decisões, administram o dinheiro e a propriedade, enfim, são as líderes políticas, religiosas etc.  Não existe casamento entre os musuo. Quando um homem e uma mulher se apaixonam, não passam a viver juntos: a mulher continua  na sua casa e o homem na dele, ao final do dia o homem vai à casa da mulher e, se ela quiser, o deixa entrar. Ele jamais dorme na casa dela. Os filhos dessa relação são criados sempre pela mãe, aliás, não existe a palavra “pai” no idioma mosuo. Meninos e meninas são criados no ambiente de uma família governada pela mãe e ficam nesse seio familiar por toda a vida, já que não existe casamento e ninguém sai de casa para viver com o cônjuge. Quando o casal não quer mais manter a relação, o homem simplesmente deixa de ir visitar a mulher e tanto ele quanto ela estão livres para encontrar outros parceiros. Não existe a idéia de divórcio nem de separação de bens. Não existe também a palavra “guerra” e os índices de criminalidade nas terras mosuo são praticamente nulos.

Embora as mulheres ocupem o lugar central nessa sociedade, os homens não são vistos como seres inferiores, pelo contrário, são amados, respeitados e criados com muito carinho pelas mães. Quando crescem ajudam as irmãs na criação dos filhos delas, ou seja, são os tios que representam a figura masculina na família, não os pais.

 

Jovens trajando roupas típicas mosuo

É surpreendente a existência de uma sociedade desse tipo dentro de território chinês, cuja etnia Han representa pelo menos 91% da população. A etnia Han é profundamente patriarcal e, desde a adoção da política do filho único na China, o assassinato de bebês do sexo feminino se tornou tão corriqueiro que reduziu drasticamente a população feminina do país. A redução da população feminina na China chegou a tal ponto que atualmente ameaça o país, frente a isso o governo chinês adotou políticas de proteção às menininhas: detectada uma gravidez de uma menina, autoridades do governo acompanham a mãe para evitar que ela seja obrigada a abortar ou que a criança seja morta depois de nascer. É nesse país hostil às mulheres que persiste a pacífica e matriarcal sociedade mosuo!

Infelizmente o povo mosuo está ameaçado. Suas terras estão localizadas em uma região belíssima e o governo chinês tem interesse em explorar o lago Lugu como destino turístico. Estradas estão sendo construídas, o que tem poluído as límpidas águas do lago, e o crescimento populacional na região pode acabar por sufocar a cultura dessa sociedade tão interessante e tranqüila. Vamos torcer para que os mosuo não entrem na lista dos povos extintos pela ganância e incompreensão.

Gostou? Saiba mais no site oficial da Associação do Desenvolvimento Cultural Mosuo (em inglês)